terça-feira, 6 de setembro de 2011

C.B.


Câmara ardente, o lugar de origem das palavras
fogo que queima as ideias findadas num tempo perdido,
arrumadas em memória indefinida que emerge em segmentos
de momentos tão sentidos, agora sinto a dor de ter sido completo
na minha inconsciência passada, na minha clareza de livro escrito
numa repentina assentada.

Toda uma vida escrita numa fria tarde de inverno
para que eu por dentro arda em páginas escritas por ti.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Andy Warhol


Lata de conserva aberta, em movimento sobre quatro rodas a
escaldar, cheia de quatro pessoas, com uma película de sol a
cobrir a superfície de contacto maior
feita de pele e de escalpes, desconcertadamente,
o vento arrasta os cabelos e as ideias
para lugares menos habituais.

   Vinho e gin tónico entre viagens rurais,
por dentro das terras mais esquecidas pelas pessoas
mais sedentas pelos estímulos que o contacto
com o sangue repleto de novidade fazem sentir,
terras nunca esquecidas pelo tempo de encher e servir
sempre mais uma rodada de vinho e de pão.


   A ideia imatura de quem nunca teve que mexer
nos verdadeiros interiores palpáveis, feitos de tecidos
ensanguentados, com o seu odor e textura muito próprios
que inspiram uma concreta finitude orgânica,
de quem não sabe reconhecer que antes de uma verdadeira
natureza intelectual, existe sempre sangue, carne e ossos,
julgando que as ideias nascem em lugares insípidos
e são posteriormente servidas, com todas as cerimonias,
dentro de bandejas de prata, a utopia do kitsh
é uma coisa curiosa, somos todos animais
defecantes das merdas mais repugnantes
e, no entanto, aspiramos à pureza imaculada de seres divinos.


   A imagem de um talhante a proferir ideias poéticas
e filosoficamente profundas, enquanto cheira uma rosa branca,
faz sempre rir o aristocrata que alguns ostentam na sua mais implícita natureza.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Contudo


Sonhei.

Ovos gigantes dispostos em valas paralelas,
para mais tarde germinarem do seu interior uterino
compostos putrefactos que atraem moscas
de pigmento verde metalizado.

Em busca de tranquilidade nas ruínas
de um templo infestado de almas perdidas,
sob céus negros em suspensão, prestes a cair
com todas as suas culpas e fraquezas
sobre as nossas consciências incompletas de certeza
repletas de pensamentos de criança perdida.

Caio a cada obstáculo que se apresenta ao meu percurso
quase sempre repleto de tentativas de entender cada dificuldade,
por mais minha que seja esta experiência de sucumbir,
existe sempre alguma novidade e consequente equilíbrio,
disfarçado de tudo, será sempre sentido, em toda a sua pequenez,
intimida-se a criança que se esconde por dentro
a olhar para o vazio introspectivo residente no velho
que está sentado lá mais à frente, ainda assim, brinca ao faz de conta.


O medo tem uma forma muito peculiar de nos abraçar,
as articulações moem os ossos num atrito industrial,
manufacturação em linha de dor, alma parcialmente amputada,
fazendo-nos sentir impiedosamente vivos, sempre que
a parte que já lá não está ainda tenta alcançar,
precipitando-nos em quedas de abismo finito.


Pressão atmosférica demasiado elevada,
todos os mecanismos biomecânicos a falhar em cadeia,
nas zonas mais frágeis da pele abrem-se fissuras
sangram onde existiam feridas cicatrizadas.

Foda-se. Palavra imperativa ao acordar!

terça-feira, 3 de maio de 2011

Tempos Estranhos


Em fuga, conduzir com destino incerto,
ir até sentir alguma vontade maior de parar.

Ultimamente tenho andado perdido,
sem saber onde empregar energias construtivas,
dou por mim a divagar quilómetros,
horas de quilómetros à hora, mil anos numa hora.

A maior novidade de ontem,
ter que mudar um pneu furado quando era quase noite,
as pessoas que passavam por mim estavam atentas à minha tarefa
visto estar a parado a seguir a um semáforo,
não faço ideia o que pensariam,
talvez reparassem no colete deflector sujo de estar atrás de um banco
há mais de dois anos sem ser usado,
talvez se recordassem da ultima vez que tiveram um furo e
a consequente tarefa de mudar um pneu.

Antes, fui de encontro a vestígios de outros tempos,
tentar encontrar uma razão num menir ou num cromeleque,
sentei-me numa pedra côncava a imaginar,
possivelmente esta pedra teria sido onde se sentavam
os mais pensantes da altura ou os mais doentes, ou até,
talvez, podia ter sido como uma espécie de berço para recém nascidos,
seja como for, sentei-me e tentei perceber-me.

Dei por mim a tentar entender as aves
a linguagem usada por um casal de pombos que por ali esvoaçavam,
andam todos à procura uns dos outros, machos e fêmeas,
a natureza de todos animais é basicamente a mesma, seja num simples piar,
seja numa poesia de escrita infinita, só muda a complexidade,
simples ou complicada.

Uma das provas que ando mesmo perdido é o meu estômago,
ando sem apetite, cheguei a casa e comi um prato de sopa,
o meu estômago agradeceu-me a coragem,
fiquei sentido pela gratidão demonstrada por ele.

Vou dormir sem esperas para ver
o que o meu subconsciente tem para me mostrar
espero acordar amanhã noutro modo,
num mais simples seria bom.

domingo, 27 de março de 2011

Once Soundtrack - Falling Slowly






I don't know you

but I want you

all the more for that

words fall through me

and always fool me

and I can't react



games that never amount

to more than they're meant

will play themselves out



take this sinking boat

and point it home

we've still got time

raise your hopeful voice

you had the choice

you've made it now



falling slowly

eyes that know me

and I can't go back

wounds that take me

and erase me

and I'm painted black



well you have suffered enough

and warred with yourself

it's time that you've won



take this sinking boat

and point it home

we've still got time

raise your hopeful voice

you had the choice

you've made it now



take this sinking boat

and point it home

we've still got time

raise your hopeful voice

you had the choice

you've made it now



falling slowly

sing your melody

I'll sing it loud

loud

quarta-feira, 23 de março de 2011

No final da espera


Necessito de te ter mais perto.

As coisas inevitáveis entram sempre em rota de colisão,
algumas decididas por nós, outras surgem de surpresa,
acidentalmente.

Numa noite em que tudo ardia no centro da povoação,
em que tudo estava coberto pelo frio mais gélido que
possa ser sentido no centro do interior,
o calor libertado aquecia aqueles que circundavam
em contemplação da madeira transformada em brasas,
com labaredas a dançar desconcertadamente,
acenando em desespero para a lua de inverno que as olhava.

Noutra noite senti o peso das pálpebras em dor,
os meus olhos ansiavam por uma hibernação
que nunca irá chegar em tempo certo,
a necessidade de uma definição é sempre
o tema principal das esperas,
nessa noite parecia-me dia irradiado por um sol
reflectido numa lua.

Pensei.

A mil à hora, tudo passa numa velocidade terminal,
todas as coisas simultaneamente a acontecer,
muitas delas passam por nós em sentido oposto,
são apenas vislumbres arrastados, luzes disformes em fuga,
passam por mim em tangentes quase desafiadoras, quase.

Tempo...

Numa noite necessitei de te ter muito mais perto,
ao saber verdadeiramente que nunca mais te iria ter.

Descobri que te amava mais que tudo ao deixar de te ter.


No final apenas sobrou a insatisfação, a tristeza
e a espera por um lugar belo deu lugar a um vazio maior,
um lugar repugnante, onde a morte sorri a todos.