quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Descalço


Os pés que contactam com a terra, que caminham e dançam
por entre rara grama que está de raizes fincadas nas pedras,
o pó da terra cobre os corpos que dançam e caminham sobre os pés,
somos terra e grama que não cria raiz com pés nús que percorrem.


O eclipse da lua sobre a fogueira rodeada de pessoas do mundo,
talvez algumas até de outros mundos, certamente algumas,
já só falta um rasgo de lua a ser escondido pela terra,
os instrumentos e as vozes afinam-se em cima do palco.


Eu vejo tudo isto a acontecer enquanto bebo e oiço,
sentado num amontoado de troncos de madeira.


De origem desconhecida, cheiro aquilo que está á minha frente,
desde o forasteiro ao vizinho que fuma ópio á janela,
fala-se disto e daquilo enquanto se bate o pé,
diz-se que está frio com um sorriso,
aconchega-se o estomago com mais qualquer coisa,
que o mantenha ocupado enquanto as pessoas fabricam
muitissimo bem o exterior, manufactura em estado de fervura.


Em espontânea desconsciência colectiva,
a casca dura e permeável absorve tudo naturalmente,
a parte de dentro é mole e suave de tudo o que a compõe,
desde o embrionário aceitar num primeiro grito silêncioso
até ao mais atrapalhado e breve tropeçar no escuro.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Zombie


Noite longa, gente alcoolizada pelo surreal que cai e sorri,
perante o sangue que corre através da sentida sonolência,
perdidos no meio de todos, no centro deles mesmos,
no interior onde se viaja por sitios inundados pelo etilico espirito,
aquele que conversa com dizeres entusiasmantes,
com palavras convincentes de um total descrente.

Oiço, o murmurio cavo do morto-vivo, a palavra mais escura,
o sofrimento mais sincero e crú vociferado que clama pela vida,
num dialecto primordial horripilante que continua a ser impossivel,
não passivel de descrição através de qualquer engenho,
embora repetido numa espiral infinita por todos nós, crentes.


O dia nasceu, a luz finalmente suprimiu o murmurio colérico
da noite, maquilhando-o como uma brisa que acaricia
o sub-consciente adormecido no leito de uma lua sempre presente.