sábado, 24 de novembro de 2007

Claustros


Abro a porta do carro depois de mais um percurso nocturno
ponho-me a caminhar com os pés em bloco de inverno,
o chão está molhado da chuva que se finda aqui, caminho
pelo passeio de calçada e reparo na água que se esconde por entre
as pedras desalinhadas, caminho sobre o brilho molhado delas,
ele move-se comigo, num padrão próprio e igualmente desalinhado.


Tenho pensamentos de recluso que se sente preso entre o principio
e o fim, que se quer fazer sentir tão próximo, como se o desejasse,
tento descobrir porquê.



Começo por reparar na máscara que esconde o que está mais dentro,
é frágil, máscara que passados os tempos se torna parte exclusiva
ao ficar incrustada na alma, passando a ser a única face existente,
que tenta não sofrer, e por tentar, sofre todos os medos por aquilo
que nunca foi visto, medo a sujar até o mais dentro dos esqueletos.



Retiro a máscara castradora



Sinto o que estava escondido a começar a expandir,
ao crescer, o seu tamanho abrange tudo o que consigo vêr
tudo o que consigo imaginar e idealizar,
interajo com quem se encontra mais perto,
sinto a rudez das suas máscaras a apertar
ao ponto de esmagar e dilacerar as partes mais frágeis
atrofiadas e mortas pela asfixia social.



Volto a concentrar-me apenas em mim,
nas coisas que me fazem querer,
nas coisas que me fazem crer.
Estou completamente exposto aos elementos invasivos,
por uma existência mais plena de estímulos.



Começo por querer algo, pego num principio e faço-o evoluir
da forma mais detalhada possível de real e sofrer
ao limite de intensidade de uma vívida recordação
antevejo o desejo e a esperança e começo a nutrir o medo
pela aceitação que tudo tem um cruel e certo fim.



Encerro este pensamento clautrofóbico numa esplanada de máscaras,
sítio onde todos passam e todos sabem quem são os outros
um sítio onde ninguêm se conhece,
fazendo lembrar um bando de aves exóticas
que partilham o mesmo sitio de nidificação,
exemplo análogo de uma tentativa existencial simples e lógica,
em tudo primitiva e funcional de um majestoso coma
das reais capacidades daquilo que sente, sonha e entende.



O brilho molhado nas fendas desalinhadas da calçada,
que ao mover-se comigo, quis ser alinhado e recto,
fez-me duvidar.






sábado, 17 de novembro de 2007

Coiso


Em ponta fina de metal que expele limpeza pensativa
concentração de água fria que lava as impurezas mortas
aquelas que estão na terra e atraem as moscas
assim purificámos os nossos corações por um bater
mais compassado de sangue vivo.

Para que exista um receber mais puro de estimulos
em tudo quanto inspiro e aglutino,
ao sentar-me neste velho banco de madeira
decorado de torres e castelos a cair.

No tempo que parou por nós e cessou por momentos
o desmoronar deste mundo á nossa volta.

Em perturbado silêncio tentámos decifrar este pedaço
de tempo que foi e será para sempre apenas nosso,
e ansiando por entender o que vive em ti, quis
enquanto me atrapalhei com toques que me denunciaram
suspirei e senti-me vivo em ti.

Era tarde e afastámo-nos na incerteza de novo eclipse lunar
saimos de mansinho por entre as pedras que continuaram a cair
entre as mulheres que espreitavam ás janelas das portas de madeira
e a sul permaneci a ver o por-de-sol a norte.

Estremeci.

Ao vê-lo descer as escadas a sorrir, amei-o pra sempre.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Monocromático


Hoje saí do sono com a mesma visão escura e baça.

Com a mesma perspectiva periférica que observei as ninfas
abissais e os altos vôos seguidos da sua vertiginosa queda
nos sitios de água desconhecida e turva de ansiedade,
onde territoaliza o Sonho.


Levantei-me da cama de madeira escura de verniz gasto
ainda de movimentos arrastados, dirigi-me à água que correu
mais próxima, em missão de renovação ocular, no encontro de
água descontaminada de incerteza, plena de brilho
consegui repôr alguma clareza e recalibrar a ferramenta
que pensa ser introspéctiva.


As cores não conseguiram fazer o seu habitual sentido
senti-as diferentes de significado e confundi o que reflectiam
reorganizei-as em dois sitios distintos, um agradável e outro
infeliz, adoptando uma visão colorida de sentido monocromático .


segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Lua d´Inverno


Recebendo a parte de luz clarividente que nos foi destinada
tivemos a absorção que foi limitada por nós próprios ao desejar
em total acordo tudo o que nos foi dado.


Convalescente-mente aceitámo-nos.


De partes mais pequenas, de insignificantes tamanhos que somos
em fronte deste interlúdio singular, aparentado com o temido caos
sempre que menosprezamos com o suposto entendimento,
em tudo redutor, em tudo lancinante pelas sombras no espaço do mais
profundo consciente, primitivo e animalesco de subserviência.


Procuro entender observando a paisagem sozinho,
vejo as pequenas elevações a sul que a terra faz,
as variações de tonalidades nos socalcos circundantes,
sinto-as sob a forma de sopros de luz que esbatem no
meu consciente, corro ideias de descrente que começa
por querer acreditar, mas porém, apenas julgar e condenar
ao tentar soprar de volta as imagens prós sombrios socalcos
da terra.


O pôr-de-sol está próximo, o frio nocturno começou a descender
sobre mim, sobre a minha cabeça, sobre esta parte de terra,
em breve deixarão de se distinguir os sombrios socalcos
das pequenas elevações terrenas onde repousarão aves negras,
momento em que os questionares se unirão numa única lua de inverno
orgulhosamente gélida e pálida, que nos revelará por dentro,
todos os mistérios feitos de desejo e medo.